domingo, novembro 06, 2011

Voltei!

Em breve... mais textos.

quarta-feira, agosto 31, 2011

Elogio ao Inverno

O sol escaldante do verão e o calor que avermelha a pele e a alma não bastaram para que as palavras pipocassem da mente e, saltitantes, imprimissem no papel a alegria da estação.A areia da praia, terapêutica a alguns, irritante a muitos, foi sentida e esquecida, assim como as ondas que, dóceis, tentaram também reavivar o impulso da escrita. Assim, o verão passou e não instigou palavra alguma a cantar sobre o sol e seu reinado. 
O outono, então, apresentou-se. Os dígitos do termômetro anunciavam uma leve queda da temperatura e as nuvens começaram a se dissipar assim que as árvores afirmavam seu despudor.  Mais denso e menos gritante, o outono talvez pudesse realizar o feito não concretizado pelo verão, apesar das vãs tentativas deste. As palavras, entretanto, mais uma vez desviaram-se de seu objetivo primordial. O papel continuava ali, à espera. Desejava ser usado, abusado por cada uma delas, o que não aconteceu. As folhas forravam o chão e as palavras nada diziam sobre o tapete aveludado que se formava aos pés das árvores desavergonhadas. O outono também passou. Abriu as portas para o austero inverno, que com seu dom, soprou para longe as folhas e o tapete, instaurando como marca o arrepio. Radical, despiu as árvores, conservador, cobriu o corpo das pessoas. Embaçou os vidros e aqueceu alguns corações. O inverno não admitia a fuga das palavras, queria todas para si, as obrigaria a dizerem algo a seu favor, assim como aceitaria que o criticassem também. Provocou a pele da moça, tocou a nuca do rapaz. Ambos, seguindo então seus instintos de sobrevivência, encostaram-se para que aquela sensação de frio se dissipasse. A natureza, sábia e perspicaz, deu-lhes um empurrão e o calor de repente transformou-se num incontrolável incêndio cujo fogo somente a moça e o rapaz percebiam.
E foi dessa forma que as palavras encontraram um coração onde repousar, e a moça, ao sentir tantas delas pesando em seu interior, procurou uma folha solta de papel para servir de descanso a todas aquelas palavras agitadas. O inverno, logo, sorriu. Presunçoso, porém, inspirador inverno.

terça-feira, julho 05, 2011

O Viajante


O viajante

Por mais que tentasse, nada preenchia o vazio no qual se encontrava a sua alma. Apesar de ser uma pessoa com uma vasta experiência de vida, era como se, a cada viagem, nada antes tivesse aprendido. Muitos o menosprezavam, por não exercer qualquer função honrosa. Ele era um viajante. Seus proventos às vezes eram fruto da venda de objetos para antiquários, outras vezes, produto de boas jogadas em algum cassino clandestino, ou ainda, de trocas. Já passara por situações difíceis, insólitas, inesquecíveis. Mas mesmo assim, a cada novo quarto de motel, a cada cama, a cada espelho, era como se nada tivesse antes conhecido, como se nem mesmo tivesse conhecido a si mesmo, como se estivesse na companhia de um estranho; os momentos em que estava só tornaram-se cruéis, desesperadores. As companhias eram frívolas, o quarto era sombrio e a cada dia sua solidão tornava-se ainda mais severa.  Procurava sempre manter alguma esperança, a esperança de encontrar a si mesmo. Entretanto, a cada dia, a cada noite, a cada minuto se sentia muito mais longe disso.
A cada porta aberta, poderia encontrar uma razão para tanto sofrimento. Sofrimento, pois sentir-se só certamente é a dor mais profunda e insistente da vida. E todos os lugares por onde passava poderiam trazer um possível fim para essa dor interminável, ou pelo menos, um alívio. Mas nada, nada trazia sua serenidade de volta, todos que transitavam pelas ruas, todos que o cumprimentavam, todos nada traziam.
Foi quando, numa manhã como tantas outras, ele acordou sentindo-se livre. Tal qual o vento, que possui o poder de visitar lugares diferentes, que pode tocar nos homens a qualquer momento, que pode subir até os céus e voltar, trazer um frescor nos dias quentes ou até mesmo gelar os ossos nas estações mais frias. Sentia-se o próprio vento neste dia. Poderia quase sair flutuando ali mesmo, sem nem ao menos levantar-se. Viu, no alto de sua cabeça, o lustre balançando vagarosamente, e com as pontas dos dedos fez o movimento que o objeto desenhava no teto. Sorriu, como há anos não sorria, um sorriso de criança que diverte-se com sua arte, e sentiu-se à vontade para levantar-se e buscar algo para comer. Não comia já há dias, e seu estômago suplicava por uma fruta suculenta e doce; doce como a vida haveria de ser, suculenta como todos os prazeres já experimentados e como os que ainda viriam a ser. Sentou-se em sua cama, e o quarto já não era o mesmo, ou era e ele nunca se dera conta. O espelho estava ali, mas parecia envolto numa áurea faiscante. Seu corpo, leve, seguiu o caminho de todas as manhãs ao refletor, mas desta vez, o reflexo foi outro, completamente diferente. O rosto, antes castigado pelos sentimentos que o corroíam, agora apresentava linhas suaves; suas maçãs assimilavam-se a maçãs reais, seus lábios davam a impressão de terem sido pintados por um artista, assim como seu nariz, e seus olhos transformaram-se em um par de prismas. Sim, aquele era realmente ele. Após contemplar-se, tomou o caminho do cômodo mais quente da casa. Foi até a cozinha e desconsolou-se. Nada para comer. Mas não, sair naquele momento seria outra descoberta, talvez ainda mais interessante. Pegou seu casaco e saiu, sentindo-se o homem mais poderoso.
Abriu a porta de sua casa. A rua continuava ali, igual, e as pessoas também iguais. Mas não se importava com os outros. Agora ele tornara-se a própria brisa matinal. Viu a banca de frutas, e era como se nunca tivesse visto a beleza e a pureza das mesmas. Rápido chegou bem perto delas, e diante de tanta variedade ficou um pouco indeciso, mas logo fez suas escolhas. A primeira seria um belo melão, com suas cores verdes e amarelas, e a segunda seriam vários morangos, de uma vermelhidão semelhante ao rubro da face de uma garota tímida ao ser beijada pela primeira vez. O vendedor entregou-lhe os pacotes e disse o valor. Pagas, ele as levou para sua morada para apreciar a delicateza da tez de cada uma delas, e não deu importância alguma à rudez do vendedor. Agora seria sua vez de admirar a gentileza da vida.
Ao chegar, dirigiu-se à cozinha, agarrou uma faca e, contemplativamente, cortou uma pedaço do melão e vários morangos. Dispôs ambos em um prato fundo e iniciou o ritual. Ingeriu-as, deliciando-se com o sabor de tão divinas frutas como se aquele fosse seu último desjejum. Nunca antes tinha sentido tão intensamente o prazer de comer, e, ainda mais maravilhado, percebeu que sua vida fora, nos últimos 30 anos, apenas um amontoado de tentativas de fuga. Ele fugia de si mesmo, dos outros e dos simples prazeres da vida sem nem perceber. E verdade era que a vida era simples demais, assim como suas melhores coisas. Uma fruta, o vento, o pôr-do-sol. Um beijo, o toque. Uma música, o silêncio.

180 graus


180o

Visto ao longe, parecia alguém comum. Uma pessoa como tantas. Tinha um sonho, um cachorro, tinha medo. Não era insensível, de forma alguma, mas não acreditava no sentimento rotulado “amor”. Para ele, não passava de uma invenção mercadológica, assim como Papai Noel. Gostava de música eletrônica, mas já havia balançado sua cabeça inúmeras vezes em shows de metal. Na verdade, ele compartilhava de apenas uma ideologia, a própria. Acabaria descobrindo quem era de verdade. Talvez isso acontecera quando se deu conta de que interpretara papéis durante toda a sua vida. Na escola, no trabalho, no “amor”.
Sempre foi inteligente, mas desde pequeno não possuía modelos. Sua mãe quase sempre estava ausente, seu pai o subestimava. Nada de carinho, “é coisa para meninas”. A solução era chamar a atenção, e a partir disso, mentir. Tentava fazer com que sua vida se tornasse interessante aos pais. É claro que não funcionava, e ainda era pior quando caía em contradição e era pego mentindo. Porém, isso durou ainda algumas décadas.
Na adolescência, não possuía amigos. Era considerado o patife, o bobo. Nenhuma garota, é claro. Chegou a se apaixonar, tentou achar algum meio de demonstrar isso. O resultado foi humilhante, aquele belo rosto, aquelas duras palavras, a imagem demorou a sumir. Decidiu mudar.  Deixou de lado os óculos, adotou um novo corte de cabelo. Passou a dominar alguns hábitos peculiares das pessoas mais populares. Foi aí que interpretou seu primeiro papel. Os garotos populares naquele momento eram os cabeludos.
Após muitas aulas, aprendeu a tocar. Juntou-se a vários outros do grupo e montaram então uma banda. Deixou o cabelo crescer, usava camisas e calças surradas. E foi aceito, não só pelo grupo, mas também pelas garotas. Assim acabou “rolando” sua primeira experiência sexual. A partir de então, algo aconteceu com ele. Percebeu que a saída era ser o que não era.
Alguns anos se passaram, cansou-se. Deixou a banda, cortou o cabelo. Decidiu ganhar dinheiro, pois assim o nível de vida e das garotas subiria. Estudou muito e procurou uma profissão de status; entrou na universidade. O curso era engenharia de computação. Escolhera o que em menos tempo lhe traria lucros. Dentro de alguns anos, tornou-se dono de uma das melhores empresas de softwares. Ficou rico, aproveitou-se de tudo o que o dinheiro poderia oferecer. Foram inúmeras viagens, inúmeros bens, inúmeras garotas.
Mas havia excedido o limite. O seu limite. Não se controlava mais. Seu triunfo e, ao mesmo tempo sua obsessão, era a cada dia ganhar mais dinheiro e a cada noite ganhar mais uma garota. Resolveu dar mais uma guinada. Largou tudo, menos, é claro, sua enorme reserva financeira. Fez uma plástica. Pintou o cabelo.
Decidiu que seria pai de família. Resolveu dar tudo o que não teve ao seu rebento, que com certeza seria diferente dele. Seria feliz. Entrou em um curso para gestantes, pois somente assim poderia interpretar convincentemente o papel de pai, já que nada sabia sobre. Fora o espanto das grávidas, tudo aconteceu como ele planejava. Quase pôde sentir o feto! Ah, como seria bom ser uma mulher nesse estado!
E por falar em mulher, precisava de uma. A mãe. O grande abrigo. As asas protetoras. Deveria ser uma fortaleza, com aquele ar doce, fala mansa. Deveria ser alguém que permanecesse dentro de casa. Nada de mulher independente! Mas, onde?
Foi tomar uma ducha. Os pensamentos corriam, os olhos estalavam. O que fazer? Já conhecera tantas mulheres! E até as que manifestaram em algum momento o instinto maternal não serviriam. A mãe de seu filho, afinal, não possuiria aquele cheiro de lascívia.
O sabonete corria entre seus dedos como o tempo. Já era tempo. Já passara do tempo. Esperou a água limpar toda aquela sujeira. Água fria, depois gelada. O tremor.  Não seria qualquer uma. Seria especial, seria a mãe que ele não teve. Havia a afeição da avó, mas a sensação de ter sido amado durou apenas alguns anos de sua infância. Enxugou-se com uma das toalhas, começando pelos pés, depois pernas. Seu sexo entumeceu-se, não tanto pelos movimentos da toalha, e sim, por sua grande capacidade de resolver os problemas da melhor forma possível! Nada, nada mais grandioso! Seu corpo todo enrijeceu-se diante da constatação de tal idéia. Deu então uma virada de 180 graus, olhou-se no espelho e encarou, por trás de sua face enrugada, o rosto doce da mãe perfeita.

segunda-feira, julho 04, 2011

Para quem quiser ler


Voltava do aeroporto numa estrada de alta velocidade, e pisava fundo. Sempre dirigia ouvindo as músicas de seu pendrive no volume máximo, porém, dessa vez somente o silêncio a embalava. Um silêncio cheio de palavras, as ditas e as emudecidas. E aquelas que não conseguira transformar em voz insistiram  em fazer morada em seu coração, como espinhos. Doía tanto que, naquele momento, seus olhos encheram-se de lágrimas e, para não perder o controle  - da direção, de seus pensamentos - resolveu ligar o som. A música que começou a tocar, entretanto, a fez descarregar ainda mais todas as lágrimas que haviam sido guardadas dentro de si, e ela se deixou levar pelos sentimentos que não queria externalizar há algum tempo. Era melhor assim, e em meio aos soluços, abaixou o vidro do carro, para sentir o vento secar seu rosto. Não era tristeza... não sabia ao certo o que era. O dia fora perfeito, como todos os outros em que se encontraram. Talvez o problema fosse esse: porque era algo bom demais. E impossível.

Enquanto tentava se recompor, lembrou-se do início daquela história. Refletiu sobre o passar do tempo, os acontecimentos, e aos poucos voltava à realidade. Ninguém conseguira fazê-la sentir aquilo, em momento algum de sua vida. Era intenso demais, e inexplicável, e por mais que, durante meses, ela conseguisse acreditar que poderia esquecê-lo, assim que seus olhares se cruzassem e eles se tocassem, seria como se o tempo não existisse. Como se nada tivesse mudado. Suas tentativas de racionalizar a respeito fracassaram, não havia explicação... Será que ele também se sentia assim? Perdido?

A estrada chegava ao fim, logo estaria em casa. Todas as vezes em que tentou se entregar a alguém, feriu-se. As cicatrizes eram feias, seu medo e sua insegurança tornaram-na indiferente. Mas ele era seu ponto fraco. Sua intenção, naquele dia, era despedir-se dele. Iria encerrar a história,  de uma vez por todas, afinal, ele havia recomeçado... então sorriu. Não conseguiria parar. Era seu veneno e, ao mesmo tempo, o antídoto. Dessa vez, não negaria mais, nem a ela mesma, o que desejava tanto. Não pediria nada a ninguém, não daria explicações, não mentiria mais a si mesma. Aproveitaria cada segundo que pudesse ao lado dele, para contrariar sua natureza... pois a vida é maravilhosa, quando realmente vivemos.

"Eu gosto do impossível, tenho medo do provável, dou risada do ridículo e choro porque tenho vontade, mas nem sempre tenho motivo. Tenho um sorriso confiante que as vezes não demonstra o tanto de insegurança por trás dele. Sou inconstante e talvez imprevisível. Não gosto de rotina. Eu amo de verdade aqueles pra quem eu digo isso, e me irrito de forma inexplicável quando não botam fé nas minhas palavras. Nem sempre coloco em prática aquilo que eu julgo certo. São poucas as pessoas pra quem eu me explico." Bob Marley

quarta-feira, maio 04, 2011

Um dia na Arcádia



Às vezes, por mais que tentemos, não conseguimos entender os eventos que tomam forma e, de repente,  transformam-se em história. A nossa história. O tom alaranjado do céu, ao amanhecer, nos priva do mundo onírico arquitetado por Morpheus e leva-nos à realidade de mais um entre tantos outros dias. O ritmo do trabalho nos força a esquecer por algum tempo os devaneios, mais uma vez. O mundo concreto ao invés do abstrato, o dinheiro no final do mês, as contas atrasadas, tudo ao mesmo tempo. Enquanto isso, o tempo cumpre seu dever e o que era presente há pouco tempo já se tornou o passado do qual nos relembraremos com nostalgia ou iremos tentar esquecer. E mais uma página do livro de nossas vidas é escrito.

Talvez o segredo seja apenas viver. O problema é: como? Os árcades talvez tivessem razão, ao retomar o valor do bucolismo, ao criticar o poder centralizado e elevar a Arte, assim como retomar o sentido do "Carpe Diem" de Horácio. Entrar em contato com o natural, sentir a presença dessa energia tão simples e poderosa, em minha singela opinião, deveria ser algo comum, e não extraordinário, como o é. A arte, então, poucos são os que procuram pela beleza da arte pela arte, a expressão subjetiva e pautada pela percepção, pelas emoções e ideias, que pode ser contemplada num momento cotidiano como o abrir das janelas. Refletir sobre as questões mais mundanas, estimular o senso crítico também faz parte desse viver, e, o mais importante: colher o dia!

Todavia, esses são apenas pensamentos que, se não transformados em palavras e, posteriormente, em sentenças, logo se dissipariam em meio às demais obrigações que me espreitam agora. O concreto versus o abstrato. 


sexta-feira, fevereiro 25, 2011

Somos. Podemos.

Eu posso falar alto e baixo, ouvir mpb e rock n' roll, sentir calor e frio, provar sabores doces e amargos, ver o por-do-sol e seu nascer, sentir cheiros de flores e de enxofre. Posso querer viver dentro de uma gaiola ou de uma jaula, posso querer percorrer todo o caminho necessário até encontrar o fim do arco-íris. Posso ser livre, posso querer ser amarrada. Posso tentar melhorar as coisas, posso tentar terminar com tudo. Posso. Posso. Posso. No poço, no fundo, sabemos que o caminho não pode ser mais para baixo, e então erguemos nossas cabeças e vemos a luz que vem por cima. Este é o único caminho e podemos escalar aos poucos.

O que somos pertence a nós, é o que temos e o que vamos deixar, é o nosso único bem ou único mal. E os dias passam, as experiências acumulam, e os anos voam. Mas as lembranças se enterram em nossas mentes. O que fica, o sabor residual de cada grito e sussuro, de cada trilha sonora, do suor e do arrepio, dos raios claros da manhã e do alaranjado do final do dia. O saber residual da vida em si é o que importa, a verdadeira experiência.

Um dos maiores prazeres da vida é desfrutar desses sabores todos. Mas, talvez ,o maior deles seja reviver o momento exato em que nos propusemos a escalar, tijolo por tijolo, aquele poço tão profundo. É um troféu invisível que somente os olhos de nosso interior conseguem ver, o esforço individual que somente cada um sabe o quanto doeu. 

Então, com tantas festas, risos e bonanças, se esquece da dor. Mas o sabor deve permanecer para que nos lembremos que nenhum buraco que nos aprisione poderá conter nossa necessidade de experimentar. Somos. Podemos.






sexta-feira, fevereiro 11, 2011

About...

Comentário... Black Swan

    Sou fã de Natalie Portman desde a sequência de Star Wars - eis minha raiz nerd, ou melhor, geek. Depois com Closer, me surpreendi mais uma vez. Dentre tantos outros bons filmes e boas atuações, comecei a buscar notícias sobre novos projetos, filmes em que atuaria, etc. E, desde o início das filmagens de Black Swan, estava animada e feliz por mais um trabalho que seria bem conduzido, afinal, ela levou muito a sério todo o complexo enredo e assimilou basicamente todo o processo criativo do diretor, outro grande nome, Darren Aronofsky. A primeira imagem que vi foi a do poster que imprime a foto de Natalie Portman encarnando o cisne negro, com aqueles olhos vermelhos e maquiagem gótica. Enfim... nada mais natural que, ao ficar sabendo da estreia do filme, ansiasse por assistí-lo. Mas, com o tempo apertado, só consegui hoje - uma semana depois. É claro que já contava com o estardalhaço que a obra faria, e de certa forma, fiquei apreensiva, pois com tanta expectativa - minha propriamente e também aquela criada pelos comentários alheios - poderia me decepcionar. Mas não foi o caso, Natalie é Natalie e não só por ela, mas pela história e demais personagens, saí do cinema bem perturbada. Era esse o intuito, afinal.
   "O lago dos Cisnes", obra de Tchaikovsky, fora um fracasso na época de sua première, segundo consta. O filme se vale de uma premissa interessante em relação ao fracasso - a companhia de dança está em declínio, sua principal bailarina - Winona! -  é forçada a se aposentar e então o diretor está à procura de alguém que consiga o feito de colocar novamente o grupo nos holofotes. Interessante foi que, em dado momento do filme, pensei no quanto somos pressionados, em todos os âmbitos, a sermos perfeitos e nunca aceitarmos o fracasso. Essa pressão dá o tom ao filme. É essa a base de discussão.
"Seja perfeita!"
   A perfeição, para o diretor da companhia, entretanto, não mora na técnica tão somente. A perfeição pode ser - e deve ser - encontrada no desapego, na leveza, no descontrole. Oras... não acredito na perfeição. Acredito na imperfeição, e está aí o grande segredo: na eterna busca pelo perfeito, devemos usar mão do que temos, o imperfeito. Lógico e incontestável. 
   Há muito o que dizer ainda, e pensei a respeito do quanto queremos manter o controle sobre nossos atos e pensamentos, no quanto somos torturados pelas falsas impressões e pelo desejo. O desejo de chegar ao lugar mais alto, de conquistar - e que, em grande parte das vezes, não é um desejo próprio, mas sim incentivado por alguém a quem queremos agradar - pode nos ferir e nos lança num abismo de psicoparanoias. A falta de autoestima, nesses casos, ampara a autoflagelação e a culpa. O medo nos faz criar realidades desesperadoras, falsas, que nos convencem de que estamos à beira do fracasso, o que não queremos.
"Minha garota meiga!"
   Outra pauta, esta. Por que devemos perseguir a perfeição também em relação ao nosso comportamento? O que a garota meiga ganha em relação àquela que segue seus instintos, que não deixa de desejar, mas que admite sua imperfeição? E que preço se paga por ser - ou encenar - a boa moça? Há, sim, um preço alto demais: uma total desintegração da psique, e assim, diversos problemas relacionados à personalidade. Não, obrigada. Mesmo em família, existem focos desse tipo de desequilíbrio: mães que são controladoras e que tentam impor, conscientemente ou não, seus sonhos como objetivo de vida aos filhos. Resultados desastrosos para quem seguir essa linha de raciocínio. 
   Para todos os que ainda não viram o filme, não se preocupem: se consegui dizer algo, fiquei apenas na superfície. O que eu quero mesmo é compartilhar minha vontade - que é enorme - de poder ser imperfeita, numa sociedade que, hipócrita, desvia o olhar do que é humano e passa, cada vez mais, a endeusar o inalcançável.